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Textos




 
 
Sabedoria se intui!
 
 
Teresa de Ávila escreveu cinco mil páginas em forma de cartas, prosa ou versos, sentada na banqueta baixa e apoiada à luz de uma débil lâmpada a óleo. (Elizabeth Reynaud)
 
 
 
Ao ler um dos livros de Elizabeth Reynaud, que dedicou quinze anos de sua vida ao estudo sobre Teresa de Ávila, fiquei me lembrando de grande parte de minha vida, quando eu escrevia pequenos bilhetes e os colocava na porta da geladeira. Às vezes havia tantos deles que abrir a porta sem derrubar metade era feito impossível! Os meus bilhetes nunca foram lidos para quem eu os escrevia e uma boa parte deles amarelou com o tempo. Tenho ainda um ou dois poemas, provavelmente escondidos dentro das inúmeras caixas de meus escritos, espalhadas em cada buraco disponível dos meus armários. Só falta coragem de abrir as caixas e reler a minha eterna busca de sabedoria.
 
Havia uma fase que eu preparava a leitura com um verdadeiro ritual. Eram dias muito místicos, fechada em uma concha impenetrável, onde nem eu mesma sabia o resultado de feroz busca de respostas para as centenas de perguntas que eu me fazia. Queria entender como as pessoas conseguiam viver sem ter o gosto pela leitura. Nem jornal, nem santinho de igreja, nem pequenas piadas que adoçam a vida. Queria entender os gritos dos que queriam ser ouvidos com vozes de muitos decibéis partidas de suas gargantas, como se as pessoas fossem totalmente surdas e incapazes de ouvir-lhes a voz, mesmo que fossem submetidos à tortura psicológica em sussurros nos ouvidos, cuja força e resultado esperado eram exatamente os mesmos.

Queria entender porque alguns gostam de economia e outros de sonetos, porque existem pessoas que passam a vida inteira a fazer o mal e se postam com altivez - ou falsa humildade , na mesma proporção – e colocam a mão no peito no primeiro banco de qualquer igrejinha ou catedral. Queria saber por que muitos tinham tudo e poucos tinham nada. Queria muito ser sábia...Somente depois de muitos anos é que fui começando a entender a maneira de ser de cada um e o verdadeiro significado de ser sábio. Eu tinha uma curiosidade imensa de descobrir as peripécias que a mente humana faz. Não é que eu me imaginava como uma bruxa de chapéu longo ou uma fada com varinha de condão, mas um dia eu ia descobrir, mais cedo ou mais tarde.

 
Descobri que os relacionamentos não duram para sempre, que vivemos em eterna busca de sermos felizes, que somos meros hóspedes deste enorme complexo que é a terra, que a vida nada mais é que uma passagem de vinda e de volta. Algumas pessoas possuem tanto pra dar e se fecham, recusam-se a procurar pelo que é simples e bonito e essas pessoas são exatamente as que fazem parte de nossa vida, na maioria das vezes.  Num momento qualquer, um lampejo passará como um meteoro no seu modo de pensar e será possível que elas passem a entender aquilo que alma sabe há muito tempo.
 
Esta noite foi uma das mais difíceis de conciliar no sono. Ao mesmo tempo em que o meu pensamento fazia viagens numa velocidade de um avião, eu queria dormir. Pensava nos meus filhos, longe de mim a maior parte do tempo, vivendo as suas vidas em outras casas. Como estão, como é a vida deles, se gostam de pão branco ou moreninho, se sentem dores, se riem às gargalhadas, se fazem carinhos em suas esposas e lhes enviam flores, ou se escrevem um bilhetinho qualquer, nem que seja no guardanapo do restaurante preferido. Pensava nos amores que eu tive e descobri que cada amor tem o seu valor enquanto ele existe. Depois que acaba, não há como fazer com que volte. O passo que você deu há um segundo não será repetido jamais. Pensava na plenitude da paixão, aquela dos lençóis e rendas, de música que lhe vira de cabeça pra baixo, de saudade de um momento que foi vivido há apenas um minuto.
 
Ter sabedoria não é ser expert em todos os assuntos que rodeiam o nosso mundo, mas sim ter a capacidade de lidar com todas as situações da vida com presteza. Nosso corpo encontra a alma – quando nos viramos pelo lado avesso e enxergamos a grandeza da existência com simplicidade e plenitude.

Depois de fazer uma viagem de trezentos mil metros em minha cama, peguei no sono. Ganhei uma TV do meu filho número dois e a colocamos em meu quarto. Nunca tive TV no quarto, porque eu achava que o quarto é lugar pra dormir. Depois, pensando bem, eu preciso me adaptar à vida de – quase – todos os seres humanos, parar de procurar ser sábia, porque eu apenas sou uma joaninha pousada no ramo de margarida.

 
Teresa de Ávila que o diga!
 
 
 
 
Domingo, dezoito de julho de dois mil e dez
Para os meus amores Rodrigo e Ricardo, que me ensinam a ser sábia a cada dia.
 
 
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Sunny L (Sonia Landrith)
Enviado por Sunny L (Sonia Landrith) em 18/07/2010
Alterado em 29/12/2010


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